9 de ago. de 2011

Visitação da Igreja


Sempre que calha em caminho e me sobra o tempo, entro na Igreja da Visitação, uma das poucas que resistiu incólume à última grande guerra. O interior vale bem uma “visitação” frequente, com o seu púlpito rococo em forma de navio e o seu tabernáculo em ébano e prata. Mas onde acabo sempre por me deter com maior vagar é num quadro pendurado na nave esquerda, de que desconheço o autor. Tão-pouco sei quem é a figura masculina que, com grande desvelo, sustenta nas mãos um bebé de colo, mas é uma personagem que me intriga. Parece tentar compreender o que a criança balbucia e fixa nela o olhar, como se lhe quisesse perscrutar os pensamentos. Sente-se mais pequeno do que aquele que segura nos braços. Sente que, afinal, nada terá para lhe ensinar. Um homem maduro, que se sabe indefeso perante um menino despido, que estende os braços para lhe afagar a barba. Um homem experiente, que nesse encontro vê abaladas as convicções de uma vida inteira. Um homem a quem resta uma única certeza, que o deslumbra tanto quanto o inquieta: a certeza de que viu a luz do mundo.